“É importante um financiamento justo das iniciativas relativas às alterações climáticas”
É a primeira reunião do género no continente. A Cimeira Africana sobre o Clima começou esta segunda-feira, dia em Nairobi, no Quénia, e irá durar três dias. Assegurada está a presença de cerca de 20 chefes de Estado, bem como do Secretário-Geral da ONU, António Guterres.
O continente é particularmente afectado pelas consequências das alterações climáticas, apesar de ser responsável por apenas 6% das emissões totais de CO2. Um dos objectivos desta reunião é permitir que os países africanos tentem falar a uma só voz nos grandes eventos internacionais, como a COP28, que se realizará em novembro nos Emirados Árabes Unidos.
Para Edmond Totin, professor na Universidade Nacional de Agricultura do Benin, responsável pela coordenação e redacção do capítulo africano do relatório Sobre alterações climáticas encomendado pela ONU e publicado no ano passado, só o facto de uma cimeira deste género se realizar pela primeira vez em solo africano mostra até que ponto a questão das alterações climáticas preocupa os governos do continente, porque “até agora havia a impressão de que se tratava de um assunto de investigadores. E a investigação, por si só, não é suficiente para provocar uma mudança fundamental neste domínio”, adianta em entrevista à RFI.
Totin considera que uma mudança de práticas em África é muito importante. “Mas não se trata apenas de uma questão de mudança de práticas, há também, e penso que estes são os temas que certamente voltarão a ser abordados nesta cimeira, o financiamento, o financiamento justo das iniciativas relativas às alterações climáticas.” E acrescenta: “Penso que há um grande debate em torno destas questões. Quando olhamos para a questão do financiamento do clima hoje, o quadro actual mostra que o acesso aos mecanismos de financiamento para apoiar as iniciativas climáticas, particularmente para os países africanos, é muito mais complexo e difícil, e o relatório que saiu no ano passado mostrou, em particular, que os países da África subsaariana têm a maior taxa de rejeição das propostas do Fundo Verde para o Clima. Outra coisa que tentámos realçar neste relatório é que mais de metade dos fundos que são adquiridos são efetivamente desembolsados, pelo que tudo isto torna as coisas mais complexas e coloca os países africanos em maior risco.”
Para o especialista “os presidentes reunidos na cimeira defenderão um mecanismo que permita distribuir estes fundos de acordo com os níveis de vulnerabilidade e exposição dos países. A outra coisa que está relacionada com isto é a mobilização de dinheiro, porque podemos pensar que as alterações climáticas são apenas uma questão para os líderes, mas penso que, e isto também é dito no relatório, é muito importante conseguir forjar parcerias estratégicas, em particular a forma como conseguimos mobilizar financiamento do sector privado.”
Até agora, o relatório mostrou que apenas 17% deste financiamento provém do sector privado, e é importante “que se consiga mostrar que as alterações climáticas não são apenas uma questão para os líderes, que precisamos do apoio do sector privado.”
Ainda de acordo com Totin um dos erros é pensar-se que as alterações climáticas são um assunto que diz respeito apenas a cada país. “O exemplo que menciono frequentemente é a luta contra a erosão costeira entre países, nomeadamente na costa ocidental africana. Veremos um só país a concentrar-se no desenvolvimento de um programa de construção de pontões, mas não tem em conta que a construção desses pontões significa apenas transferir o problema para o país vizinho, esquecendo que, quando a situação se deteriorar no país vizinho, os habitantes procurarão deslocar-se para outros países onde a vida é melhor.”
No final está prevista uma “Declaração de Nairobi”. A ideia, é realçar os trunfos do continente, e também criar um mecanismo que possa forçar o compromisso político, que possa forçar o decisor político a ser muito mais cuidadoso no investimento neste sector.