ONU aprova envio de força liderada pelo Quénia para pacificar o Haiti

O Conselho de Segurança do Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou ontem, dia 2 de Outubro, o envio de uma força multinacional para o Haiti liderada pelo Quénia para ajudar a combater os gangues violentos que têm lançado o caos neste país das caraíbas.
A resolução, elaborada pelos Estados Unidos da América (EUA), foi aprovada com 13 votos a favor e duas abstenções, China e Rússia. A resolução autoriza o destacamento da força por um ano, com revisão após nove meses. Esta será a primeira vez que uma força será enviada ao Haiti desde uma missão aprovada pela ONU há cerca de 20 anos.
A data de envio não foi definida, embora o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, tenha dito recentemente que uma missão de segurança ao Haiti poderia ser enviada “dentro de meses.”
A iniciativa foi saudada pelo ministro das Relações Exteriores do Haiti, Jean Victor Geneus, por trazer uma “réstia de esperança para as pessoas que há muito tempo sofrem as consequências de uma difícil situação política, socioeconômica, de segurança e humanitária.”
Um avanço nos planos para o envio da força ocorreu em Julho, quando o Quénia se voluntariou para liderar a mesma propondo enviar 1.000 efetivos. A resolução apela ao envio de uma “missão multinacional de apoio à segurança” – não oficialmente uma força da ONU – com um “país líder” em coordenação com o governo haitiano.
O Haiti sofre há décadas com a violência dos gangs, mas a actual onda agravou-se após o assassinato do Presidente Jovenel Moïse, em Julho de 2021. A partir daí os bandos assumiram o controlo de grandes partes do país, lançando o terror sobre os residentes e matando centenas de pessoas. A capital costeira, Port-au-Prince, rodeada de montanhas, é aterrorizada regularmente por gangues fortemente armados, segundo algumas estimativas, controlam cerca de 80% da urbe. Armados com armas automáticas contrabandeadas maioritariamente dos EUA, os membros dos gangues têm frequentemente mais armas do que a polícia local, queimando por vezes as suas viaturas e esquadras. Uma anarquia semelhante assola vastas áreas do oeste e centro do Haiti, onde “bandidos” errantes, como os locais chamam aos membros dos gangues, invadem e queimam aldeias e cidades, provocando o caos nos serviços públicos e perturbando o trabalho das agências de ajuda humanitária, na nação mais pobre do mundo ocidental.
O que o Quénia ofereceu
Quando esta proposta foi conhecida, em Julho, as autoridades quenianas disseram que os seus agentes iriam proteger os edifícios e as infra-estruturas governamentais, mas este plano inicial alterou-se depois de o Quénia ter enviado uma missão de averiguação ao terreno no mês seguinte. Após a avaliação, o Quénia pretende enviar uma força de intervenção que neutralize os bandos armados, proteja os civis e promova a paz, a segurança e a ordem.
Numa entrevista à BBC, o Ministro dos Negócios Estrangeiros do Quénia, Alfred Mutua, disse que o seu país também gostaria de ajudar o Haiti a reconstruir infra-estruturas vitais e a estabelecer um governo democrático estável.
As Bahamas, a Jamaica e Antígua e Barbuda já disseram que vão participar na missão e o ministro acrescentou que a Espanha, o Senegal e o Chile também deverão enviar pessoal de segurança.
Os Estados Unidos comprometeram-se a apoiar financeiramente a missão com 100 milhões de dólares, tendo também o Canadá oferecido financiamento.
Ganhar os corações e as mentes
Esta intervenção liderada pelo Quénia, contudo, divide opiniões no país alvo. Há os apoiantes da operação que dão as boas-vindas aos “nossos irmãos africanos”, mas há também os grupos da oposição que veem Ariel Henry – que assumiu o cargo de primeiro-ministro logo após o assassinato do Presidente Moïse – como um líder ilegítimo “de facto” cujo governo será reforçado pela intervenção estrangeira. Há ainda críticos radicais que acusam os EUA e outros governos ocidentais de tentarem utilizar os soldados quenianos para promover interesses “neocoloniais” e “imperialistas” no Haiti. Um famoso chefe de um gangue, o ex-polícia Jimmy Cherizier, conhecido como “Barbecue”, avisou que resistiria a qualquer força estrangeira se esta procurasse manter Henry no poder. Uma coisa é certa: os agentes da polícia queniana, ao entrarem em confronto com os gangues, terão de ter o cuidado de evitar vítimas civis inocentes, ganhando assim a batalha dos “corações e mentes”.