Morreu Jacques Delors, um construtor da União Europeia
Faleceu, ontem, quarta-feira, dia 27, o francês Jacques Delors, antigo presidente da Comissão Europeia. Delors era considerado o “pai do euro”, destacando-se como ainda entre a esquerda francesa. Contava 98 anos.
O anúncio foi feito pela sua filha, Martine Aubry, à agência de notícias AFP. “Morreu esta manhã em sua casa em Paris, enquanto dormia”, declarou Martine, que é também presidente da Câmara de Lille.
Nascido em 1925 em Paris, o economista e político socialista francês ocupou o cargo de ministro da Economia e Finanças e foi depois presidente da Comissão da Comunidade Económica Europeia. O longo exercício deste cargo, que durou de 1985 a 1994, ficou marcado pelo alargamento da Comunidade aos países ibéricos, pela adopção do Acto Único Europeu e pela assinatura do Tratado de Maastricht.
Favorito nas sondagens, Jacques Delors diminuiu as esperanças da esquerda ao recusar concorrer às eleições presidenciais francesas de 1995. Na altura, 13 milhões de telespectadores assistiram em directo à sua renúncia.
“Não me arrependo”, mas “não digo que tinha razão”, declarou à revista Le Point em 2021. “Tinha uma preocupação muito grande com a independência e sentia-me diferente das pessoas ao meu redor. A minha maneira de fazer política não era igual à dos outros.”
Em Bruxelas, Jacques Delors ajudou a desenhar os contornos da Europa contemporânea, nomeadamente no estabelecimento do mercado único, na assinatura dos acordos de Schengen e do Acto Único Europeu, no lançamento do Programa de intercâmbio de estudantes Erasmus, na reforma da Política Agrícola Comum e no arranque da União Económica e Monetária que levaria à criação do euro.
Em Março de 2020, numa altura em que os chefes de Estado e de Governo dos 27 Estados-membros da União Europeia lutavam por alcançar uma resposta conjunta à pandemia de covid-19, Jacques Delors apelou a mais solidariedade.
Através dos seus think tanks (grupos de reflexão) “Club Witness” e “Notre Europe” (mais tarde chamado de “Instituto Jacques-Delors”, com escritórios em Paris, Bruxelas e Berlim), o francês defendeu avidamente o fortalecimento do federalismo europeu, exigindo mais “audácia” na altura do Brexit contra aqueles que considerou ataques “de populistas de todos os tipos”.
Uma carreira ao serviço de França e da Europa
Após uma carreira no Banco de França, de 1945 a 1962, Jacques Delors tornou-se membro do Conselho Económico e Social e chefe de serviço dos Assuntos Sociais no Comissariado Geral do Planeamento até 1969, onde foi nomeado secretário-geral para a formação permanente e para a promoção social.
Foi membro do gabinete do primeiro-ministro Jacques Chaban-Delmas, de 1969 a 1972, encarregado dos assuntos sociais e culturais, bem como das questões económicas, financeiras e sociais.
Foi professor associado da Universidade de Paris-Dauphine, de 1974 a 1979, e dirigiu o Centro de Pesquisa Trabalho e Sociedade. Foi membro do Conselho Geral da banca francesa, de 1973 a 1979. Ensinou também na Escola Nacional de Administração.
Enquanto membro do Partido Socialista francês, em 1974, e do seu comité director, em 1979, foi eleito parlamentar europeu em 1979 e presidiu à Comissão Económica e Monetária até Maio de 1981. De Maio de 1981 a Julho de 1984, Delors foi ministro da Economia e das Finanças e foi também eleito presidente da Câmara de Clichy, de 1983 a 1984.
Recebeu o título de Doutor Honoris Causa de mais de duas dezenas de universidades, bem como diversos prémios e distinções: prémio Jean Monnet (1998); prémio Louis Weiss (1989); prémio Prince des Asturies (1989); prémio Charlemagne (1992); prémio Carlos V (1995); prémio Erasme (1997); prémio da economia mundial (2006); medalha Nijmegen da paz (2010).
Delors casou-se em 1948 com uma colega que partilhava as suas convicções sindicais e religiosas, Marie Lephaille, falecida em 2020. Tiveram dois filhos: Martine Aubry (1950) e Jean-Paul (1953-1982), que morreu de leucemia.