Mediação africana para a paz na Ucrânia divide sociedade civil do continente

Os chefes de Estados Macky Sall (Senegal), Cyril Ramaphosa (África do Sul), Hakainde Hichilema (Zâmbia) e Azali Assoumani (Comores), deslocaram-se à Ucrânia na quinta-feira passada e à Rússia na sexta-feira, encontrando-se com os seus homólogos. Em Kiev, Volodymyr Zelensky rejeitou qualquer tentativa de mediação e, em São Petersburgo, Vladimir Putin saudou a abordagem equilibrada de missão de paz africana.
A sociedade civil africana, encontra-se dividida em relação a esta missão de mediação africana. Marc Ona Essangui, do Gabão, presidente da organização “Tournons la page”, um movimento internacional de cidadãos que reúne cerca de 250 organizações que coordena e difunde acções para promover a mudança democrática em África, considera que os chefes de Estado que lideraram a missão encontram-se demasiados divididos e que África tem organismos autorizados para conduzir este tipo de mediações.
“Esta viagem é um fracasso diplomático. O que é que conseguimos? O presidente Zelensky rejeitou e a mediação e o presidente russo falou, como de costume, no seu inglês deficiente, não disse nada de concreto. As personalidades envolvidas nesta mediação não eram apropriadas. Se África quer enviar um mediador, temos organismos africanos. Temos a CEDEAO, temos a CEECA, temos a União Africana. Era absolutamente essencial que as vozes da União Africana se fizessem ouvir. Estas são, de resto, vozes apartidárias. Não indivíduos que já se declararam coveiros da democracia e que já se posicionaram como amigos da Rússia ou da Ucrânia, e isso distorce tudo. Penso que a indiferença demonstrada pelo presidente ucraniano tem origem nesta minha observação. Pessoalmente, gostaria de ver posições claras sobre a cessação das hostilidades, quer do lado ucraniano, quer do lado russo.”
Porém, a investigadora Liesl Louw, conselheira sénior do ISS International Crisis Group, discorda. Para esta especialista em questões políticas a missão não constitui um fracasso, mas sim um primeiro passo. Mas não deixa de sublinha que a divisão diplomática entre os Estados africanos é um obstáculo a este tipo de mediação.
“Penso que é um primeiro passo, mas ficámos com a impressão de que havia alguma divergência no seio da delegação. Os presidentes Macky Sall e Azali falaram de um primeiro passo, de boa vontade, enquanto o presidente Ramaphosa fez declarações sobre a necessidade de o conflito não conhecer uma escalada ainda maior, o que irritou Zelensky e, certamente, Putin também. Portanto, não estavam em sintonia. Isto é uma fragilidade. Porque, para que haja uma próxima delegação, temos de chegar a um acordo: quem é o porta-voz? Aguardamos com expectativa a cimeira Rússia-África em São Petersburgo, no final de julho. Vai ser muito interessante ver quantos chefes de Estado estarão presentes e, se alguma vez virmos uma maioria de chefes de Estado de 54 países africanos na Rússia, é o Presidente Putin que sai a ganhar nesta história”, refere Louw.