Morosidade processual domina queixas na Provedoria de Justiça

A morosidade processual dos tribunais domina, anualmente, o número de queixas ou denúncias registadas pela Provedoria de Justiça no país, revelou a responsável máxima da instituição, Florbela Araújo.

A responsável do organismo de defesa e garantia dos direitos e liberdades dos cidadãos, que falava durante o recente encontro de trabalho com a chefe da Delegação da União Europeia em Angola, fez questão de esclarecer que os maiores casos que aparecem na Provedoria têm a ver com reclamações sobre a falta de celeridade no tratamento dos processos em tribunal.

Paralelamente às queixas sobre a morosidade de processos, referiu Florbela Araújo, ao organismo chegam ainda queixas relativas aos casos de excesso de prisão preventiva, que diz ter diminuído consideravelmente, e de reclamações sobre pedidos de liberdade condicional.

A provedora de Justiça esclareceu que a maior parte das queixas são feitas por homens, facto que deixa transparecer, segundo Florbela Araújo, a ideia de que “as mulheres têm um bocado de timidez” para reclamar, sempre que confrontadas com situações de injustiças.

“Dentro destas queixas, recebemos muitas de grupos vulneráveis, por exemplo, devido à morosidade de processos nos tribunais. Mas, a maior parte dos países ainda tem dificuldade em fazer julgamentos com celeridade”, lamentou a responsável, para em seguida alertar para o facto de tais situações originarem a denegação de justiça.

“A ninguém deve ser negada a justiça e a morosidade processual viola o direito do cidadão”, reiterou, sublinhando que, diante de casos do género, o provedor encaminha o processo ao presidente do tribunal, por ser órgão independente e com obediência apenas à Lei.

Crescimento de queixas

A provedora de Justiça referiu que o número de casos de queixas na instituição registou um crescimento. Adiantou que os números variam de mês para mês, tendo, em 2021, a instituição registado uma média de 800 a 900 queixas. Este número, revelou, subiu consideravelmente no ano passado (2022), ao fixar-se em mais de 2.500 queixas.

“Naqueles anos em que houve a Covid-19 e que estivemos muito fechados, abrimos audiências através do telefone e vídeo conferência, mas achamos que o ano passado foi o que tivemos mais queixas, com mais de dois mil e quinhentos casos”, afirmou, tendo esclarecido que há meses em que as queixas são maiores e outros menores.

Para constatar a situação real dos cidadãos em conflito com a Lei, Florbela Araújo garantiu haver uma interacção muito forte a nível dos órgãos e serviços penitenciários, com visitas constantes, sobretudo ao nível da Comissão da Prisão Preventiva, coordenada pelo presidente da Câmara Criminal do Tribunal Administrativo.

Durante as sessões de visitas, a Provedoria de Justiça coloca questões relacionadas aos reclusos com excesso de prisão preventiva e sobre os que aguardam por liberdade condicional.

“Todas estas questões têm sido colocadas e temos tido sucesso nesses casos de defesa dos direitos dos reclusos. Todas as situações que encontramos quando visitamos, colocamos às autoridades competentes, de forma a que os serviços penitenciários tenham melhorias”, argumentou.

Vítimas de violação sexual evitam denunciar por tabu

A provedora de Justiça lamenta o facto de as vítimas de violência sexual raramente apresentarem queixa. Florbela Araújo justificou tal constatação com o facto de ser, ainda, um tabu as pessoas denunciarem que foram violadas.

“Ninguém se queixa de questões de violência sexual”, afirmou a provedora de Justiça, adiantando que, às vezes, são os pais que se queixam, admitindo que tal só acontece “quando há morosidade dos processos” a nível dos órgãos de investigação. E acrescentou: “Ainda é um tabu alguém fazer queixa de que foi violada”.

Esclareceu, entretanto, que quando o cidadão apresenta uma queixa à Provedoria, por escrito, audiência, telefone ou email, a denúncia é admitida e, dentro do âmbito da actuação do provedor de Justiça, são notificados os órgãos da Administração Central e Local do Estado que caem no âmbito da actuação do provedor de Justiça, quando há violação dos direitos do cidadão.

A queixa, disse, é recebida pela direcção das áreas especializadas que trata da reclamação e faz a triagem, para apurar se se trata de uma queixa apresentada pela primeira vez ou se já é sequência de anteriores.

Para cada queixa do cidadão é aberto um processo, dentro do âmbito da actuação, mas “se for algo muito urgente, o procedimento é ao nível dos pontos focais, para saber como se pode resolver a questão”.

De resto, Florbela Araújo atribui o aumento diário do número de queixas em todo o país ao trabalho desenvolvido ao nível dos chefes dos serviços provinciais, por intermédio de palestras sobre divulgação do papel e função do provedor de Justiça.

“No acto de visitas, também se faz recomendações do que se deve melhorar. E temos melhorado, paulatinamente, graças à divulgação do nosso trabalho”, assegurou.

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