Rejeição de candidatos às eleições presidenciais tunisinas suscitam dúvidas quanto a transparência do processo
Catorze dos 17 candidatos que anunciaram concorrer à Presidência da Tunísia, foram detidos ou impedidos de concorrer, o que faz, no mínimo, duvidar da transparência da votação que terá lugar a 6 de Outubro. Na segunda-feira, dia 9, a Comissão Eleitoral Independente (CEI) tunisina aprovou apenas três candidatos, excluindo outras três candidaturas que o Tribunal Administrativo tinha reintegrado no fim de Agosto.
Na verdade, muitos observadores afirmam que a CEI carece de independência já que o próprio Presidente Saïed nomeou todos os seus sete membros.
Heike Löschmann, directora, em Tunes, da Fundação Alemã Heinrich Böll, ligada ao partido alemão “Os Verdes” entende que “com a decisão da Comissão Eleitoral Independente de não aceitar a decisão do tribunal administrativo sobre a admissão de três candidatos adicionais, o processo foi finalmente deslegitimado”, refere a Deutsche Welle (DW).
Além de Saïed, foram admitidos como candidatos Zouhair Maghzaoui, um ex-membro do Parlamento, e Ayachi Zammel, um empresário que lidera um pequeno partido pró-negócios. No entanto, ainda não se sabe se esse último poderá de facto concorrer. Após a sua aprovação como candidato, as forças policiais detiveram-no temporariamente, a 4 de Setembro. O seu advogado disse à agência de notícias AP que ele foi acusado de falsificar assinaturas, facto que nega.
Saïed com tiques cada vez mais ditatoriais
Kais Saïed, um ex-professor de direito de 66 anos, foi eleito democraticamente em 2019 com uma maioria de 72% dos votos. No entanto, para consolidar o seu poder, desmantelou a maioria dos órgãos democráticos do país em Julho de 2021.
Desde então, passou a reprimir a dissidência política, amordaçou os media independente e esvaziou a independência do Judiciário. Os organizações de direitos humanos queixam crescentemente dos seus tiques ditatoriais. Em meados deste ano, Saïed também dispensou a maioria dos membros do gabinete e reprimiu as principais figuras da oposição.
Para Hamza Meddeb, investigador do Centro Carnegie para o Médio Oriente, sediado em Tunes, “a situação actual não tem precedentes, pois o Presidente quer ser reeleito afastando os concorrentes, sem permitir concorrência e eleições livres e justas.”
Além das questões políticas que envolvem a consolidação de Saïed no poder, a repressão às organizações pró-migração também têm gerado controvérsia. Foram encerrados escritórios, confiscadas contas e pessoas detidas. Saïed enfatizou que a sua reeleição seria fundamental para a “guerra de libertação nacional” que afirma ser marcada por uma crise migratória.
Para o analista Meddeb, vive-se no país uma perda das conquistas obtidas na chamada ‘revolução de jasmim’, em 2011. “A Tunísia, que foi o farol democrático da região por uma década, agora está a testemunhar uma restauração autocrática com quase nenhuma esperança de voltar a um caminho democrático”, afirma.
“Migrantes são uma ameaça à sociedade”, diz Saïed
Além das questões políticas que envolvem a consolidação de Saïed no poder, a política migratória tunisina tem gerado controvérsia. Na sua campanha eleitoral, Saïed enfatizou que a sua reeleição seria fundamental para a “guerra de libertação nacional” que ele afirma ser marcada por uma crise migratória.
Nos últimos anos, a Tunísia transformou-se num dos pontos de partida mais procurados para migrantes de países subsaarianos a caminho da Europa. Mas, em 2023, um acordo de mil milhões de euros com a União Europeia (UE) para ajudar a economia em dificuldades da Tunísia fez com que o país começasse a reduzir a migração para a Itália, o que levou a uma queda de 70% no fluxo migratório, de acordo com as autoridades italianas.
Internamente, Saïed descreveu “os migrantes como uma ameaça à sociedade, apresentando-se como o salvador”, adiantou Medded citado pela DW. Porém, cada vez mais, a repressão aos migrantes também tem como alvo as organizações não governamentais tunisianas que ajudam os migrantes.